quinta-feira, 10 de julho de 2008

11 de julho: Dia Mundial da População

ESTATUTOS DO HOMEM

Artigo 1 Fica decretado que agora vale a verdade, que agora vale a vida
e que de mãos dadas trabalharemos todos pela vida verdadeira.

Artigo 2 Fica decretado que todos os dias da semana, inclusive as terças-feiras mais cinzentas,
têm direito a converter-se em manhãs de domingo.

Artigo 3 Fica decretado que, a partir deste instante,
haverá girassóis em todas as janelas,
que os girassóis terão direito
a abrir-se dentro da sombra
e que as janelas devem permanecer o dia inteiro
abertas para o verde onde cresce a esperança.

Artigo 4 Fica decretado que o homem não precisará nunca mais duvidar do homem. Que o homem confiará no homem como a palmeira confia no vento, como o vento confia no ar, como o ar confia no campo azul do céu.

§ O homem confiará no homem
como um menino confia em outro menino.

Artigo 5 Fica decretado que os homens estão livres do jugo da mentira. Nunca mais será preciso usar a couraça do silêncio nem a armadura de palavras. O homem se sentará à mesa com seu olhar limpo porque a verdade passará a ser servida antes da sobremesa.

Artigo 6 Fica estabelecida, durante dez séculos,
a prática sonhada pelo profeta lsaías,
e o lobo e o cordeiro pastarão juntos
e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora.
Artigo 7 Por decreto irrevogável fica estabelecido
o reinado permanente da justiça e da claridão,
e a alegria será uma bandeira generosa
para sempre desfraldada na alma do povo.

Artigo 8 Fica decretado que a maior dor sempre foi e será sempre não poder dar amor a quem se ama sabendo que é a água que dá à planta o milagre da flor.

Artigo 9 Fica permitido que o pão de cada dia tenha no homem o sinal de seu suor. Mas que sobretudo tenha sempre o quente sabor da ternura.

Artigo 10 Fica permitido a qualquer pessoa, a qualquer hora da vida,
o uso do traje branco.

Artigo 11 Fica decretado, por definição, que o homem é um animal que ama e que por isso é belo, muito mais belo do que a estrela da manhã.

Artigo 12 Decreta-se que nada será obrigado nem proibido. Tudo será permitido, sobretudo brincar com os rinocerontes e caminhar pelas tardes, com uma imensa begônia na lapela.

§ Só uma coisa fica proibida:
Amar sem amor.

Artigo 13 Fica decretado que o dinheiro
não poderá nunca mais comprar
o sol das manhãs vindouras.
Expulso do grande baú do medo,
o dinheiro se transformará em uma espada fraternal
para defender o direito de cantar
e a festa do dia que chegou.

Artigo final Fica proibido o uso da palavra liberdade
a qual será suprimida dos dicionários
e do pântano enganoso das bocas.
A partir deste instante
a liberdade será algo vivo e transparente
como um fogo ou um rio,
ou como a semente do trigo,
e a sua morada será sempre
o coração do homem.

Thiago de Mello. Estatutos do homem. São Paulo, Martins Fontes, 1978.

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